
A fundação da cidade de São Paulo foi marcada pela construção de um colégio no planalto de Piratininga, onde os padres jesuítas José de Anchieta e Manuel da Nóbrega realizaram uma missa em 25 de Janeiro de 1554. A escolha do local seguiu a herança portuguesa: tanto Lisboa quanto a maioria das cidades brasileiras da época foram implantadas no alto de morros, favorecendo a defesa do território. A vila foi fundada entre os rios Tamanduateí e Anhangabaú, área rica em peixes, aves e caça de pelo; com campos adequados ao plantio de legumes, verduras e frutas, e à criação de gado europeu.
Os primeiros edifícios do povoado foram construídos em taipa de pilão, técnica que se tornou uma tradição paulista; e suas vias iniciais basearam-se nos caminhos indígenas já existentes, muitas das quais permanecem até os dias de hoje. A chegada das ordens religiosas dos Carmelitas, Beneditinos e Franciscanos contribuiu para a consolidação do Triângulo Histórico, delimitado em seus vértices pelo Mosteiro de São Bento, Mosteiro de São Francisco e pela Catedral da Sé; e em suas arestas pelas ruas XV de Novembro, São Bento e Direita.
A partir de 1640, ficou estabelecido que todas as novas construções da cidade deveriam passar pela aprovação da Câmara dos Vereadores. Em 1682, a cidade tornou-se sede da capitania, sendo suas atividades mais relevantes do que as das vilas do litoral. Em 1711, a vila foi elevada à cidade pela coroa portuguesa, com aproximadamente 210 casas e menos de mil habitantes. Sua importância regional já se evidenciava pelo fato de ter se tornado um entreposto comercial ainda em pequena escala.
As águas do rio Anhangabaú eram utilizadas desde o século XVII para a lavagem de roupas, objetos ou mesmo para o banho e em seu Vale eram plantados agrião e chá. No começo do século XVIII, os campos de criação, os currais de gado, as matas de Caaguaçu e do Ipiranga, as chácaras e as casa de campo ficavam na área do Vale; e suas encostas estavam cobertas por mata, sendo que a travessia do córrego era feita por meio de pequenas pontes de madeira.
Em 1819, Saint-Hilaire indica duas importantes pontes sobre o Anhangabaú: a do Lorena e a do Marechal. Esta ligava o centro da cidade com o bairro Santa Efigênia e é considerada a primeira construção estável sobre o Anhangabaú. Aquela era inicialmente de madeira e servia como entrada e saída da cidade para a região de Itu e Sorocaba. Devido a sua fragilidade e uso constante por tropas e cargas foi reconstruída em pedra, em 1794, possuía 25 passos de comprimento por 12 de largura, era quase plana e não possuía enfeites em seus parapeitos.
A Cidade de São Paulo e o Vale do Anhangabaú
1554-1892
Vista Geral da Cidade de São Paulo | Jean-Baptiste Debret | 1827
Pintura retratando a colina onde São Paulo de Piratininga foi fundada.
Vales formados pelos rios Tamanduateí e Anhangabaú.


Ponte do Lorena | Guilherme Gaensly e Rodolpho Lindeman | ±1880
Em 1855, foi aberta a Rua Formosa para facilitar a travessia do brejo que margeava o córrego do Anhangabaú, ela conectava a região dos Piques – Largo da Memória – com a do Açu – Praça do Correio. Durante o século XVIII o Anhangabaú e o Tamanduateí eram responsáveis pelo abastecimento de água em São Paulo, por meio de aquedutos particulares rústicos e de bicas ou chafarizes públicos. O Anhangabaú também abastecia alguns conventos apesar de suas águas não serem puras.
No ano de 1850 ocorreu um forte temporal que provocou alagamentos próximos ao Vale do Anhangabaú e o desabamento da ponte da Abdicação, antiga ponte do Marechal, o que causou a destruição de muitas casas e algumas mortes. Por isso, em 1856, a prefeitura decidiu desobstruir o Vale para evitar inundações semelhantes.
Até o começo do século XIX as pontes do Lorena e da Abdicação ainda permaneciam quase iguais e na região também havia a ponte da Limpeza, transpondo o Ribeirão da Limpeza, e a do Bexiga/Antônio Manuel, onde hoje começa a ladeira de Santo Amaro. Com a intensificação da construção da “cidade nova” torna-se imprescindível a substituição ou reforma das antigas pontes, para possibilitar uma transposição mais eficiente do Anhangabaú. A canalização do rio foi apenas um dos obstáculos físicos superados, mas ainda era necessário superar seu Vale, fortemente acentuado e situado entre dois núcleos da área central.

Corte topográfico | Azis Ab'Saber | 1957
Na segunda metade do século XIX, a cidade se expande novamente, de forma mais acentuada que no século anterior, nesse período já é possível notar uma nova configuração do Vale do Anhangabaú. O surto do café foi o principal fator dessa expansão, trazendo imigrantes para trabalhar nas plantações e a primeira ferrovia do estado, São Paulo Railway, em 1867. Também nessa época, as ruas receberam os primeiros paralelepípedos; surge a iluminação a gás; os bondes de tração animal; a Rua Direita é prolongada; se iniciam as primeiras atividades para possibilitar o abastecimento de água da Cantareira e o sistema de esgotos; e a Diretoria de Obras Públicas é criada.
Referências bibliográficas
LE GRAZIE, Vera Lucia. Renovação urbana São Paulo: Vale do Anhangabaú. São Paulo, FAU, 1981.
SIMÕES JÚNIOR, José Geraldo. Anhangabaú: história e urbanismo. São Paulo, Editora Senac São Paulo, Imprensa Oficial do Estado, 2004. 192 p. Originalmente apresentado como Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo.